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Porque o nosso negócio correu mal?

Se só conheces o Synergy há pouco tempo, podes não saber, mas nós começámos por ser um Cowork (que ainda temos) e uma gelataria artesanal, a Eggas Gelataria, que fechou em dezembro de 2019.

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Photo by Eduardo Almeida

Como tudo começou

Antes de te contarmos porque o negócio correu mal e porque tivemos de fechar, vamos falar sobre como tudo começou. Já tínhamos tido um bar na praia que também tinha fechado e, a Inês, após algum tempo a recuperar do falhanço, começou a estudar mais sobre como ter um negócio na área alimentar que tivesse sucesso e sobre empreendedorismo e negócios em si. Fechar o bar tinha deixado as suas marcas emocionais e ela achou que um novo negócio na área, agora baseado em muito mais estudo e com as aprendizagens do negócio anterior, seria uma forma de redenção. Que desta vez seria capaz de ter sucesso. 

Além disso, uma das nossas funcionárias desse primeiro bar, em quem confiávamos e que se tinha tornado uma verdadeira amiga, estava desempregada e achávamos que se ajustava bem ao pretendido, pelo que a possibilidade de lhe voltar a dar emprego, ainda nos deu mais vontade de abrir este novo negócio.

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Naquela época, as bubble waffles, doce tradicional chinês semelhante a uma waffle, estavam a explodir em locais como Nova Iorque e Londres, com longas filas de pessoas ansiosas por experimentar e voltar a comer. Como ainda não havia casas de bubble waffles no Porto e havia apenas uma ou duas em Portugal, ela achou que importar esse conceito poderia funcionar.

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Photo by Eduardo Almeida

Começou a fazer bubble waffles, adaptando a receita chinesa para ter uma receita única sua, gelados (os melhores acompanhamentos das bubble waffles) e outras sobremesas em casa, com excelentes resultados. Eram produtos 100% naturais e com um sabor e textura melhores do que provamos noutras gelatarias. Colocou os doces à prova de amigos e familiares, que aprovaram, e ofereceu também em eventos para receber mais feedback sobre a qualidade dos produtos.

Nessa altura já estávamos a pensar em criar o Synergy, como espaço de coworking e a gelataria parecia um bom complemento para o cowork. Um local que permitiria aos coworkers receber pessoas num ambiente informal e comer algo sem ter de sair do espaço e atrairia mais pessoas para o cowork. Nesse sentido, alargamos a oferta da gelataria, que vendia também tostas, vários tipos de cafés e batidos, entre outras coisas.

Compramos um espaço para incluir a gelataria e o cowork, fizemos as obras com o mínimo de investimento possível, fazendo a maior parte da remodelação e da mobília nós mesmos, com ajuda de amigos e familiares, compramos os equipamentos necessários, pedimos a licença e candidatamo-nos ao SI2E, um incentivo do Portugal 2020.

E… o negócio correu mal!

Diferenças culturais

Quando pensamos em importar o conceito das bubbles waffles e do take away (que hoje a pandemia veio disseminar, mas na altura não era muito popular em Portugal), não tivemos em conta diferenças culturais e geográficas. Além do take away não ser popular, não percebemos que em Portugal, ao contrário de em muitos outros países bem mais frios até, não se come gelados todo o ano. O gelado é um doce de verão e, apesar de termos muito mais oferta a nível de doces, as pessoas achavam que, por sermos uma gelataria só vendíamos gelados e não entravam.

Como estamos localizados numa zona bastante tradicional da cidade e não numa zona turística, não conseguíamos aproveitar os turistas que estavam mais propensos a comprar novos produtos, a comer gelados no inverno e a preferir um serviço de take away. Por outro lado, cá é raro o sítio que faz fila, por termos uma densidade populacional muito menor comparado com Nova Iorque ou Londres.

Além disso, convencer as pessoas a experimentar as bubble waffles nem sempre era fácil, pois tinham receio de não gostar, uma vez que não conheciam. Educar o mercado dá muito trabalho e implica muito dinheiro que nós não tínhamos.

A montra tem de dar vontade de comer

Outro fator que influenciou o nosso insucesso foi o facto da montra não ser apelativa. Quando pensamos no design do espaço, esquecemo-nos de uma regra fundamental: passar gente à porta é quase irrelevante se não conseguires que entrem.

Se no primeiro bar que tivemos tínhamos exagerado na decoração branca e na iluminação, na gelataria tentámos aplicar o que aprenderamos, mas não tivemos em conta que uma gelataria exigia uma iluminação e disposição dos doces e gelados diferente. Conclusão, a iluminação era insuficiente e a exibição dos produtos não era visível do exterior, pelo que não apelava às várias pessoas que passavam na rua.

Os testes só são válidos se o cliente pagar

Quando testámos a qualidade dos produtos, fizemo-lo sempre oferecendo, sem cobrar. E esse teste é sempre enviesado. Quem vai recusar um doce de graça? E quem vai falar mal de um doce de graça?

Se realmente a qualidade dos nossos produtos era inquestionável pelo feedback que recebemos depois de abrir, o nosso teste não nos permitiu perceber se as pessoas pagariam para comer um doce novo como a bubble waffle, ou se voltariam para comer de novo, se recomendariam ou trariam amigos para experimentar. E a falta desse teste, saiu-nos muito caro.

O desperdício dos estabelecimentos de restauração

Além do peso financeiro dos funcionários para o negócio, os negócios de alimentação têm um enorme risco a nível de gastos com comida, porque a comida estraga-se, não fica em stock. 

Por outro lado, se pensares no teu comportamento enquanto consumidor, ao entrares numa confeitaria com pouca oferta de produtos, vais pensar que tem pouca saída e que os produtos são do dia anterior e por isso, não vais comprar ou não vais voltar.

Para contornar isso, a maior parte dos sítios fabrica muita quantidade, porém, no início do negócio, em que ainda não se tem um número de clientes suficiente, isso gera um enorme desperdício e prejuízo, que começava a minar as nossas finanças.

Como tudo acabou

Após um ano e meio abertos, fizemos um rebranding do Synergy e mudamos de Eggas Gelataria para Synergy Caffe para integrar melhor os dois negócios num só. Passamos a servir refeições leves além de tudo o resto. Alteramos as redes sociais, investimos em fotografias profissionais com um fotógrafo de gastronomia excelente (Eduardo Almeida), refizemos as ementas e padronizamos os processos para oferecermos uma experiência consistente de ainda maior qualidade.

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Notámos uma melhoria crescente e estávamos otimistas.

Infelizmente, nessa época, tínhamos dinheiro para apenas mais 6 meses e, duas semanas depois de reabrirmos, uma inundação destruiu por completo um dos nossos pisos, onde tínhamos o espaço de eventos, a oficina de prototipagem e o jardim. Isso fez com que tivéssemos de alocar o dinheiro e a nossa energia na recuperação do espaço e decidíssemos fechar a gelataria.

O segredo é começar pequeno!

Na verdade, onde é que tudo começou a correr fundamentalmente mal? No momento em que não tínhamos uma equipa nem recursos financeiros suficientes para gerir 2 negócios em simultâneo. Sim, o objetivo era que funcionassem como um só, mas na prática eram 2 negócios, com públicos distintos na maior parte das vezes. Dois negócios com exigências, atividades e processos muito distintos e uma equipa de 2 pessoas para os gerir e aos respectivos funcionários.

Num negócio que está a começar, isso é imenso! 

E precisamente por ser imenso é que tivemos de optar por fechar a gelataria e focar-nos no que realmente nos interessava mesmo, que era ajudar empreendedores a porem as suas ideias em prática e a transformá-las em negócios rentáveis, através do Synergy.

Se não tens muita experiência nem muito dinheiro para investir, começa pequeno. Testa devidamente o negócio para perceber se é efetivamente viável e foca-te num nicho de mercado apenas.

Lê também este artigo no blog acerca deste tema.