Empreender não é massajares o teu ego por concretizares a ideia extraordinária que tiveste. E ainda assim, esse é o erro mais comum de todos os empreendedores. Apaixonarem-se pela ideia que tiveram e moverem montanhas para a concretizarem à sua imagem e semelhança, para, quando a colocam no mercado, descobrirem que não é viável, ninguém quer aquilo.
E mesmo quem conhece bem os perigos deste erro, mesmo quem já lida com o empreendedorismo há muitos anos, cai muitas vezes nesta armadilha, neste truque que a nossa mente nos cria, de acharmos que se nós gostamos, se nós compraríamos, os outros também vão gostar e vão comprar.
Foi o que aconteceu a André Marquet, que depois de 5 anos a avaliar empresas que estavam a começar, para decidir se valia a pena investir nelas ou não, se decidiu lançar ele próprio e empreender, seduzido pela ideia de um amigo. O desbloqueador de etiquetas de segurança para roupa – que permitia entrar e sair de uma loja sem ter de parar na caixa e ficar dez minutos à espera, parecia-lhes uma ideia inovadora extraordinária. Tão extraordinária, que se esqueceram de validar a sua viabilidade no mercado e, após um ano de muita dedicação e algum investimento, descobriram que afinal, não tinha pernas para andar.
Porque caímos na armadilha do nosso ego empreendedor?
De certa forma, é fácil perceber o porquê disto acontecer… ninguém quer ouvir que o seu “bebé” é feio ou imperfeito. E por isso, deixam-se levar pela fantasia de que a sua ideia é incrível e que só têm de a conseguir concretizar exatamente como a idealizaram para que todos vejam o quanto é incrível.
Falar antes, mostrar antes de estar pronto é muito arriscado. As pessoas não têm visão, vão criticar porque não conseguem perceber a grandiosidade daquilo que imaginamos, mas assim que conseguirmos aperfeiçoar mais um pouco, elas vão ver e vão ficar rendidas. Além disso, mostrar a nossa ideia antes do tempo, é correr o risco de que nos copiem. A nossa ideia tão única, original e extraordinária não pode ser copiada!
E vamos deixando que o nosso cérebro nos leve nesta cantiga e vamos investindo mais tempo e dinheiro a limar todos os detalhes, até que finalmente marcamos uma data, fazemos uma grande inauguração, cheia de amigos e familiares, curiosos para ver em que é que tanto trabalhamos durante tanto tempo e, depois não há clientes. Ou há alguns e o negócio entra naquele modo de “chove que não molha”, nem cresce nem vai à falência.
A falta de perspetiva ao empreender
Agora vamos dar um passo atrás e perceber porque é que isso aconteceu. Quando imaginamos uma ideia e ficamos entusiasmados com ela, o nosso lado racional tem tendência a ser deixado de lado e deixamo-nos levar pela euforia, sem ver o que não faz sentido na nossa ideia, sem ver o que precisa de ser melhorado, sem ter em conta uma série de condicionantes de quem vai usar o nosso negócio. Deixamos de ter perspetiva.
Tal como acontece quando nos apaixonamos por alguém, naqueles primeiros tempos, tudo é perfeito e nenhum defeito incomoda. Contudo, à medida que o tempo passa, esse efeito cor-de-rosa vai passando e começamos a ver a pessoa amada com outros olhos.
Na realidade, as pessoas não estão predispostas para se apaixonarem instantaneamente pelas ideias dos outros, ou seja, pelo teu negócio, e por isso, vão ver muito mais facilmente tudo o que está errado e vão ignorá-lo.
Por outro lado, se envolveres as pessoas no desenvolvimento da tua ideia desde o início, se fores validando com clientes cada hipótese em que baseias o teu negócio, vais conseguir construir um negócio muito mais sólido e adaptado às necessidades dos teus clientes. Não só isso, como vais começar a criar uma comunidade de pessoas que já estão envolvidas com o negócio e tiveram parte nas decisões, pessoas que sentem que te ajudaram a empreender. Pessoas essas, que vão estar muito mais predispostas a comprar e a recomendar o negócio quando chegar a altura.
Na prática
Imagina uma marca de cosméticos que te deixa escolher o novo cheiro do seu creme, que te ouve para perceber se queres uma base mais líquida, mais cremosa, ou compacta, com protetor solar ou com propriedades antirrugas. Em vez de se apresentar no mercado com a nova base cremosa com protetor solar, para descobrir que afinal as clientes não querem bases cremosas ou não querem que a base inclua protetor solar.
Assim, a empresa teria gastado meses ou anos e milhares de euros a produzir a nova base, criar a embalagem, distribuir e fazer a estratégia de marketing, para passado pouco tempo retirar os produtos do mercado e começar tudo de novo, com imenso prejuízo e muita desmoralização da equipa. Todavia, isto continua a acontecer com frequência.
Por outro lado, se tivesse testado, se tivesse perguntado ao seu público e lhe tivesse dado a opção de comprar em pré-venda, antes do produto estar desenvolvido, iria ter descoberto que a sua assunção de que as clientes queriam protetor solar na base estava errada e, ao falarem com o seu público, perceberiam o que havia de errado com essa ideia e o que é que elas realmente sentiam falta numa boa base.
Poupa-te!
Sempre que quiseres empreender num negócio, acrescentar um novo produto ao teu portfólio, criar um novo serviço, pergunta primeiro ao teu público,. Faz entrevistas, faz uma versão simplificadíssima do que idealizaste e põe-na a teste com clientes reais e vai testando cada passo que dás, cada suposição que tens. Só assim vais poder poupar tempo e dinheiro e construir um negócio que de facto vai ter clientes.
Aproveita e lê também este artigo muito interessante em que te explicamos porque o nosso negócio correu mal.