A decisão de começar um negócio é normalmente acompanhada por um misto de excitação e medo. Vamos finalmente pôr a nossa ideia em prática! E se não correr bem? E se correr bem demais e não dermos conta? O que é mesmo preciso fazer e o que se deve fazer primeiro?
Como muitas pessoas começam um negócio
São inúmeras interrogações, e a tendência é pensarmos sempre primeiro nos aspetos práticos, visíveis e concretos. Queremos abrir uma loja de roupa: como se vai chamar? Qual é o logotipo? Vamos criar contas nas redes sociais e começar a vender. Ou procurar uma loja para arrendar e fornecedores para nos venderem as roupas. Abrimos atividade nas finanças e está tudo pronto. Temos uma loja de roupa online ou na rua. Os familiares e amigos entusiasmam-se com a abertura e as primeiras semanas até correm bem e depois… Nada.
Nós passamos exatamente por isso, em 2008, quando o Helder decidiu abrir uma loja de informática. Ele tinha um curso de Técnico de Sistemas Informáticos, já tinha trabalhado na Fnac no departamento de Informática e tinha um espaço disponível gratuitamente para abrir a loja ao público. Achou que não tinha nada a perder a não ser tempo, que com 19 anos, tinha de sobra.
Insatisfeito com o serviço da loja de informática local, o Helder decidiu empreender e criar a sua própria loja, que prestasse um serviço melhor. No seu entender, bastava um nome, um logotipo, um site e fornecedores com entrega rápida, para não ter de investir em stock. Abriu a loja, teve alguns clientes e, passado pouco tempo, fechou. O que correu mal?
À primeira vista, o negócio tinha muitos pontos a seu favor. O Helder tinha formação na área, experiência profissional por conta de outrem, identificou uma falha no mercado, usou os recursos existentes e começou com o Mínimo Produto Viável – o espaço que tinha e uma loja online, tudo sem stock.
Porém, quando analisamos mais em detalhe, vemos que se deixou levar pela pressa de quem quer abrir um negócio e fez o que a maioria das pessoas faz que é começar pelo nome, logotipo e site, em vez de começar pelo que realmente importa.
E afinal, como se deve começar um negócio?
O Helder deveria ter começado por perceber qual era a essência do negócio, ou seja, perceber o verdadeiro porquê de querer ter uma loja de informática, que problema de que público queria realmente resolver e como é que ele especificamente, com as suas caraterísticas, experiência e personalidade podia diferenciar o seu negócio no mercado. E sabendo isso, ficava muito mais claro qual era a motivação para ter aquele negócio e se era ou não o tipo de negócio adequado para ele e o que é que aquela loja de informática não poderia deixar de ter, mesmo numa versão inicial de testes, porque isso seria a essência dela.
Como não tinha isso, o Helder desistiu às primeiras dificuldades, em vez de ter encontrado forma de manter o negócio na sua essência, mudando o resto que fosse preciso. Quando percebeu que o facto de não ter stock fazia com que fosse necessário atualizar os preços de todos os produtos diariamente, devido às variações de preços nos fornecedores, que alguns dos produtos lhe ficavam mais caros no fornecedor do que numa loja de grandes dimensões (que comprava em larga escala) e que a sua pouca margem de lucro desaparecia e se transformava em prejuízo sempre que tinha de arranjar ou enviar algum produto para garantia, o Helder não tinha nenhum motivo para continuar.
Começa pela essência do negócio – missão e o porquê de TU quereres ter ESSE negócio
Não ter uma motivação e uma missão bem definidas, faz com que as pessoas desistam mais facilmente quando surgem obstáculos. E surgem sempre obstáculos. Havendo também o risco de, se o negócio vingar e tiver um crescimento muito rápido, poderem dar por si “amarradas” em negócios que não lhes dizem nada e as deixam infelizes.
Sabendo então qual é a essência do negócio, é preciso conseguir comunicá-la claramente, para que qualquer pessoa consiga entender e, então, falar da ideia a várias pessoas diferentes, incluindo fornecedores, para receber feedback. Se o Helder o tivesse feito, talvez tivesse percebido logo ali os problemas de não ter stock.
Benchmarking – Estudar a concorrência
Embora parecesse que o Helder tinha iniciado o seu negócio por estar insatisfeito com a oferta existente no mercado, na realidade, ele baseou-se na sua experiência individual com uma loja específica.
Para perceber como se pode diferenciar no mercado, é necessário conhecer esse mercado e saber quais são as características específicas dos concorrentes. A nível de preços, tipos de serviços prestados, comunicação, público-alvo e atendimento, para que se perceba como cada um dos concorrentes se diferencia ou não. Só assim se pode perceber como é que podemos usar o nosso conhecimento, características e personalidade únicas para tornar o nosso negócio igualmente único de alguma forma.
Estudar o público-alvo
Faltou também ao Helder estudar o público-alvo e perceber quais eram os reais problemas dele e como é que ele poderia resolvê-los. Baseou todo o seu negócio na sua experiência enquanto cliente de uma loja e isso não é suficiente.
Sem saber quem é o público-alvo, um negócio não se pode desenvolver. Nem mesmo para criar o nome, o logotipo, o site e as redes sociais, pois todos eles devem refletir a essência do negócio e comunicar diretamente com o público a quem se dirigem. É possível ir ajustando ao longo do tempo, claro! E possivelmente irá acontecer mais à frente no percurso da empresa. Porém, se não for pensado no início, pode condenar o negócio ao fracasso prematuro e os custos de fazer um rebranding (novo posicionamento da marca para apelar ao público certo) podem ser demasiados para um negócio em fase inicial.
No exemplo da loja de informática, uma loja de informática focada em jovens adolescentes que gostam de jogar no computador e editar vídeos e fotografias, deve comunicar e oferecer produtos muito distintos de uma loja focada em executivos que preferem ambientes elegantes, computadores e telemóveis topo de gama, com um design clean e inovador. Criar uma loja de informática focada num ou noutro destes públicos muda literalmente tudo! O nome, o logotipo, o design da loja online e da física, os produtos a vender, os fornecedores a contactar, e a linguagem a usar na comunicação, tudo!
Os problemas e as necessidades de cada público são distintos e têm de ser abordados de formas distintas ou então o negócio terá de ser generalista para apelar a todos os públicos. O problema de um negócio generalista, é que precisa de investir MUITO dinheiro para captar clientes e crescer, porque precisa de comunicar com muitos públicos distintos. Se não tens muito dinheiro, foca-te num público específico.
Modelo de negócio
Além de não ter havido uma reflexão sobre a essência do negócio, nem sobre se era o tipo de negócio adequado para o Helder ou não, também não houve nenhum tempo dedicado a perceber como funcionaria o modelo de negócios. Pensou nos fornecedores, mas não fez uma previsão de custos (que teriam previsto a questão das deslocações e garantias), e ganhos. Não pensou quem era o público-alvo e onde é que eles estavam, nem como comunicar com eles, nem refletiu sobre quais seriam as atividades principais da empresa para perceber à partida como seria o seu dia a dia e como lidaria com coisas como as garantias.
E esta falta de planeamento pode levar, e levou, neste caso, ao fracasso do negócio, por falta de clientes, por custos não previstos (como no caso de verba para marketing e anúncios, deslocações e material base necessário para fazer as reparações na loja, que tiravam toda a margem de lucro), por falta de uma estratégia de comunicação, etc. E é isso que acontece à maioria dos empreendedores, que começam com pressa, sem saberem ainda onde querem chegar.
Lê este artigo que escrevemos sobre como não concretizares a tua ideia de negócio.